Era um dia comum no laboratório onde o paleontólogo Flávio Pretto pesquisava na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). O pesquisador estava limpando o material que seria usado na tese de doutorado, um fêmur de dinossauro, quando um colega chegou perto e parou para observar. Naquele momento, Flávio já estava impressionado com o tamanho do osso encontrado porque, até então, os dinossauros de 230 milhões de anos atrás que haviam sido classificados tinham no máximo 1,5 metros, enquanto a nova descoberta tinha cerca de 2,5 metros de comprimento.
– O osso da coxa de dinossauros dessa época geralmente tinha cerca de 20 centímetros de comprimento. Ele tinha quase o dobro do tamanho dos dinossauros que a gente conhecia – relata.
Mas não foi apenas Flávio que ficou admirado com a descoberta. O colega que acompanhou a limpeza no laboratório ficou impressionado e comentou:
– Nossa, mas é um bagual* de um bicho, né?!
*No Rio Grande do Sul, o termo bagual se refere a um animal muito grande, mais comumente utilizado para falar de cavalos.
Embora tenha sido apenas um comentário descontraído, ali nasceu a inspiração para o nome científico do dinossauro que Flávio pesquisava na época e teve a honra de nomear: o Bagualosaurus agudoensis. A intenção com a escolha da taxonomia era que as pessoas da região pudessem se identificar e tivessem facilidade para lembrar do nome:
– Normalmente esses nomes científicos são relacionados a uma característica anatômica e eles costumam ser complicados de falar e difíceis de guardar porque são nomes técnicos, né?! Eu quis fazer essa brincadeira em referência à cultura gaúcha e ao comentário que o meu colega fez sobre o dinossauro ser um animal graúdo – explica.
O complemento, que foi a cereja do bolo, foi o agudoensis, que faz referência à cidade de Agudo, lugar onde o fóssil foi encontrado. O nome completo significa “o dinossauro bagual de Agudo”.
Para Flávio, ter pesquisado o Bagualosaurus é um passo muito importante não apenas para o mundo acadêmico, mas para a sociedade:
– A última vez que o Bagualosaurus viu a luz do sol, os morros de Santa Maria não existiam, nem o Oceano Atlântico… O mundo era completamente diferente do que ele é hoje. Esse material ficou 233 milhões de anos enterrado, ou mais, para que a gente encontrasse. Eu tive a sorte e a honra de estudar ele. É bom demais para guardar só pra gente, né? – comenta.
Curiosidades sobre o Bagualosaurus que você não sabia
Grande demais!
Uma das primeiras coisas que chamou a atenção dos pesquisadores foi o tamanho do dinossauro. Para os padrões do período triássico, época dos primeiros dinossauros, ele era grandão.
De acordo com Flávio, os dinossauros surgiram originalmente como animais muito pequenos e eles foram ganhando porte. Ou seja, tamanho e medida se modificaram durante o processo de evolução. O grupo do qual o Bagualosaurus faz parte é dos sauropodomorfos, que é o grupo que originou os gigantes pescoçudos, animais de quatro patas e herbívoros (dieta baseada na ingestão de vegetais e algas). Entre os gigantes pescoçudos famosos estão os braquiossauros e brontossauros, muito comuns, inclusive, em desenhos infantis.
– O Bagualosaurus inaugura essa jornada de crescimento que esses dinossauros teriam ao longo da vida, mas ele sozinho ainda é bastante primitivo nesse sentido porque ele é pequeno para o padrão dos dinossauros. Ele era grande para a época dele e pequeno para o que a linhagem ainda iria se tornar – resume.
Na contramão da alimentação carnívora
Enquanto os outros dinossauros eram carnívoros, as adaptações no crânio e na dentição do Bagualosaurus sugerem que ele era “diferentão” na questão da alimentação. Ele pode ter sido um dos primeiros dinossauros onívoros, ou seja, ele se alimentava de plantas. O fator que sugere isso são os dentes mais robustos e fortes, o que indica que ele poderia processar matéria fibrosa.
– A gente juntou essa informação com o fato dele estar crescendo. Então, no momento em que os sauropodomorfos começam a incluir plantas na dieta, eles começam a ganhar tamanho corporal – conta.
Cabeça pequena
O crânio, que foi uma das partes encontradas pelos pesquisadores, era muito pequeno em relação ao resto do corpo. Para o pesquisador Flávio, essa característica foi fundamental para a evolução dos sauropodomorfos, afinal, a cabeça pequena e leve poderia ser mais facilmente sustentada pelos longos pescoços que os animais do grupo viriam a apresentar.
O esqueleto inteiro é um mistério
De acordo com Flávio, outro fato curioso é que os pesquisadores ainda não conhecem o esqueleto inteiro do Bagualosaurus.
– Não conhecemos os braços dele e o pescoço, por exemplo. Temos vários outros materiais que já foram encontrados no sítio que podem ser candidatos a Bagualosaurus – comenta.
Até o momento, eles têm um pedaço da cabeça, boa parte das vértebras da coluna e a pata posterior praticamente completa.
– Desde que ele foi descoberto, estamos na busca de completar o esqueleto dele para conhecer a anatomia completa desse animal. É um quebra-cabeça que ainda não está fechado.
Conheça o bagualosaurus agudoensis no Cappa
O lar do esqueleto original do Bagualosaurus fica exposto em uma redoma de vidro no Centro de Apoio à Pesquisa Paleontológica, localizado na Quarta Colônia, na cidade de São João do Polêsine. Além dos ossos originais, também é possível ver um esqueleto reconstruído e uma cópia do animal em vida, que foi feito por um artista, baseado nas interpretações dos pesquisadores sobre como ele deveria ser.
E não é só o Bagualosaurus que mora no Cappa, outros fósseis de dinossauros e outros animais podem ser vistos na exposição. Entre eles, os parentes do bagualosaurus, como o Buriolestes e Macrocollum. Outra atração são os cinodontes, animais que tem semelhança com os mamíferos atuais.
As visitações ao Cappa são gratuitas, incluem um guia e precisam ser agendadas previamente.
Conheça o Cappa
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